A Câmara de Suzano votou e aprovou por 7 votos a 6 o relatório final da Comissão Especial de Inquérito (CEI) da Saúde, que investigou irregularidades na área no âmbito municipal. O relator foi o vereador Rafael Garcia (PSD).
Constam no relatório indícios de crimes como improbidade administrativa, desvio de verba pública, negligência médica, desvio de finalidade, abuso de poder e homicídio culposo (negligência nas mortes de 23 bebês na UTI neonatal da Santa Casa de Misericórdia).
Dentre os vários problemas, diversos empréstimos realizados em bancos diferentes, totalizando R$ 7 milhões. O interventor Marco Izzo disse, em depoimento à CEI, que isso pode ser considerado um “adiantamento de recursos SUS”, que foram utilizados para fazer uma série de modificações estruturais do hospital quando a entidade não tinha dinheiro em caixa. O pagamento desses empréstimos será feito ao longo dos próximos anos, com as parcelas dos repasses do Sistema Único de Saúde (SUS). No entanto, o primeiro empréstimo a ser finalizado será somente no ano de 2014, enquanto a intervenção está marcada para terminar em 2013.
Outra possível irregularidade está na movimentação da conta bancária da Santa Casa. Em vez de ser feita pelo tesoureiro da entidade, há documentos que comprovam que quem realiza transações é o próprio interventor pela internet, de sua casa, na cidade de Guarulhos. A conta da Santa Casa foi aberta em um banco também em Guarulhos.
Erros
Uma série de ofícios foi mandada pela CEI a funcionários e autoridades envolvidas na administração de estruturas da saúde da cidade, além de representantes de outros órgãos. No total, nove pessoas compareceram para dar depoimentos aos vereadores do grupo de trabalho. Foram eles: Francisco Seixas, membro do Conselho Municipal de Saúde; Ahmed Youssef Saleh, dono da Clínica Poá D’Or (que cedeu uma falsa médica à prefeitura); Rogério de Oliveira, membro do Conselho Municipal de Saúde; Gustavo Mendes, médico radiologista que cedia equipamentos de imagem para a Santa Casa e não recebeu os pagamentos; Michelle Sprocato, ex-auxiliar de enfermagem da Santa Casa; Gleice Rodrigues Leite, paciente que teve complicações no parto feito na Santa Casa; Marco Izzo, interventor da Santa Casa; Ariane Aparecida Barbosa, diretora de compras e comunicação da Santa Casa e Paulo Sérgio Fozato, diretor geral da Santa Casa.
Com os depoimentos, vieram à tona muitos indícios de coação (secretária de Saúde que coage membros do Conselho de Saúde para aprovarem ações da prefeitura), inadimplência (Santa Casa não pagou serviços de tomografia prestados pelo contratado), imperícia médica (bebê que teve falta de oxigenação no cérebro e a clavícula quebrada no parto) e má gestão (falta de materiais e medicamentos, as compras são feitas atrasadas, não é feita licitação para compras).
Falsa médica
Sobre o exercício da medicina pela falsa médica Rosimeire Aparecida Viana, há documentos que comprovam que ela atendeu no Pronto Socorro três pessoas que morreram: um idoso com sequelas de AVC, outro idoso com pneumonia e uma pessoa que chegou à unidade com cólica renal. Além disso, depoimentos revelam detalhes escabrosos sobre atos da falsa médica, como ordem de aplicação de injeções oleosas (que deveriam ser intramuscular) na veia.
Problemas de higiene
Nas oitivas do interventor da Santa Casa, Marco Izzo, ele reconheceu problemas de higiene do local e pessoal, por parte dos visitantes da unidade, que podem ter contaminado os bebês que morreram na UTI Neonatal. Além disso, ele reconheceu falhas na documentação da manutenção feita no ar condicionado no setor, que também pode ser considerada fonte de contaminação.
Izzo revelou também que se dá intencionalmente preferência ao atendimento de pacientes que tenham convênios médicos no Pronto Socorro. A intenção é que a Santa Casa arrecade recursos pagos pelas operadoras de planos de saúde para que esse dinheiro possa ser investido no atendimento de pessoas pelo SUS.
O interventor também admitiu que não passou documentos sobre a saúde, principalmente sobre a morte dos bebês, intencionalmente, descumprindo ordem judicial. “Vou correr esse risco”, disse ele durante depoimento.
Pedido de intervenção federal
No final do relatório, foram feitos alguns pedidos. São eles: a constituição de uma Comissão Processante (CP) para apurar práticas delitivas; encaminhamento do relatório ao Ministério Público (MP) para apuração dos indícios de improbidade administrativa; encaminhamento do relatório para o Tribunal de Contas do Estado (TCE) para adoção de medidas com relação aos contratos assinados e não cumpridos; que órgãos competentes (Ministério Público, Ministério do Trabalho, Conselho Regional de Medicina, Ministério da Saúde) enquadrem as irregularidades apontadas: desvio de função, desvio de finalidade, abuso de poder, crime de responsabilidade, nepotismo e improbidade administrativa; a abertura de processo de investigação pelo MP para solicitar a quebra de sigilo bancário da secretária de Saúde, do prefeito e do interventor; intervenção do Ministério Público Federal na Santa Casa; que o delegado titular da cidade abra Boletim de Ocorrência para apurar a conduta do interventor com relação às mortes dos bebês; que a Câmara Municipal elabore leis que obriguem secretários a prestar contas e realizar audiências mais dinâmicas; que o Conselho Regional de Medicina (CRM) informe sobre o número de registro obtido pela falsa médica.
Comissão Processante não deverá ser aprovada
Apesar dos esforços dos vereadores que votaram a favor do relatório da CEI, a Comissão Processante não deverá ser aberta, já que para isso são necessários 10 votos a favor. Mesmo que o presidente da Casa de Leis possa votar, a oposição só terá oito votos. Portanto, cabe ao MP, por meio da promotora Celeste Leite dos Santos, dar prosseguimento à investigação.
Repercussão e opiniões
Rafael Garcia (PSD)
“Infelizmente, não tenho o poder de devolver as crianças mortas ou pessoas vítimas de erros médicos às mães e seus entes queridos, mas com a conclusão dos trabalhos, tenho certeza de que isso não acontecerá mais com ninguém”. (Blog do Fernandes – 30/05/12)
Israel Lacerda (PTB)
“Temos que responsabilizar quem promoveu estas mortes. Se hoje não tem ambulância é por conta da má gestão, se não tem saúde é por conta da má gestão. Tudo imposto pelo prefeito” (Diário de Suzano – 31/05/12).
Nardinho (PDT)
“Fui contra porque não é um problema apenas da cidade. É um problema nacional. Existem candidaturas (dos membros da CEI) e houve um aproveitamento da situação” (Diário de Suzano – 31/05/12)
Derli Dourado (PT)
“Sou sempre favorável a mudanças positivas na Saúde. Mas eu não compactuo com politicagem” (Blog do Fernandes – 30/05/12)
Estevam Galvão (DEM)
“Ao invés de ajudar a Santa Casa, a prefeitura usou o método da sufocação. Praticou a intervenção, tomou para si a Santa Casa e a usurpou da Irmandade com a promessa de um trabalho melhor. Desde então, a Santa Casa deixou de existir e passamos a ter um hospital municipal administrado pela prefeitura, só que mantendo a figura jurídica da Santa Casa, para receber ajuda e repasses. Mas que melhorias foram feitas? Vinte e três mortes de bebês foram registradas. Não estamos vivendo uma crise, estamos vivendo uma tragédia” (Portal ALESP – 09/06/11).
Voto a voto
Votaram a favor do relatório:
Rafael Garcia (PSD), Said Raful (DEM), Emerson Taboada (Maria do Lava-Rapido) (PSDB), Luiz Reis (PSDB), Israel Lacerda (PTB), Dr. Valmir (PTB) e Chiquinho Passos (DEM).
Votaram contra o relatório:
Derli Dourado (PT), Alonso de Almeida (PT), Quitéria David (PT), Professor Luizinho (PT), Nardinho (PDT), e Fadul (PDT).
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(com a colaboração de Khadidja Campos)